
Como Funciona a Legítima Defesa
A legítima defesa ocorre quando alguém repele, de forma moderada e necessária, uma agressão injusta, atual ou iminente, contra si ou terceiros, sem infringir o ordenamento jurídico.
Giulia Soares
16 de outubro de 2025
9 min de leitura
Giulia Soares
16 de outubro de 2025
9 min de leitura
Compartilhe
Legítima defesa: entenda os requisitos e aplicações na prática
A legítima defesa é um dos institutos mais importantes do Direito Penal e um tema recorrente em exames da OAB e no cotidiano jurídico.
Prevista nos artigos 23 e 25 do Código Penal, essa excludente de ilicitude garante que o indivíduo que age para proteger a si mesmo ou a terceiros diante de uma agressão injusta não seja considerado autor de crime, desde que respeitados determinados requisitos.
Neste artigo, vamos detalhar o conceito de legítima defesa, analisar seus elementos essenciais, compreender as mudanças trazidas pelo Pacote Anticrime e esclarecer a questão do excesso, com exemplos práticos que facilitam o entendimento.
O que é legítima defesa?
Segundo o Código Penal, legítima defesa ocorre quando alguém, usando moderadamente os meios necessários, repele uma agressão injusta, atual ou iminente, a direito próprio ou de terceiro:
Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
Em outras palavras, a legítima defesa é a proteção de um bem jurídico — como a vida, a integridade física ou a liberdade — quando ameaçado por um agressor. A lei deixa claro: o ato é lícito e não configura crime.
Requisitos da legítima defesa
Para que a legítima defesa seja caracterizada, é necessário que estejam presentes alguns requisitos essenciais:
I - Agressão humana e injusta
A agressão deve ser praticada por um ser humano e injusta. Isso significa que não se pode alegar legítima defesa se a agressão for legítima, como no caso de agentes da lei atuando dentro de suas atribuições.
Exemplo: Maria é abordada por policiais durante uma investigação, e ao resistir à prisão, dispara contra um deles, causando a morte. Nesse caso, não há legítima defesa, pois a ação dos policiais era justa e legal.
É importante destacar que, se a agressão ocorrer por meio de um animal sob comando humano, a legítima defesa pode ser aplicada, pois o ato agressivo tem origem humana.
II - Agressão atual ou iminente
A ameaça precisa estar acontecendo no momento ou prestes a acontecer. Não é possível agir preventivamente contra uma ameaça futura.
Exemplo: João descobre que seu colega planeja atacá-lo no dia seguinte. Para se antecipar, João o agride hoje.
Não há legítima defesa, pois a agressão ainda não era atual nem iminente. A alternativa correta seria acionar as autoridades competentes.
III - Defesa de direito próprio ou de terceiro
A legítima defesa não se limita à proteção pessoal. É possível defender outra pessoa que esteja sob ameaça.
Exemplo: Carlos presencia sua irmã sendo atacada por um agressor armado. Ele age para neutralizar a ameaça e salva sua irmã. Carlos está amparado pela legítima defesa de terceiro.
IV - Uso moderado dos meios necessários
O agente deve usar apenas os meios disponíveis que sejam suficientes para repelir a agressão, e de forma moderada, ou seja, até cessar o perigo.
Exemplo: Lucas é atacado por um assaltante armado. Ele consegue desarmar o agressor com um único golpe. Se Lucas continuar a agredir o suspeito já neutralizado, haverá excesso.
É importante entender que "meio necessário" não significa menos lesivo: se o único recurso disponível é altamente perigoso, ele ainda pode ser usado desde que seja indispensável para cessar a agressão.
Legítima defesa no Pacote Anticrime
Com a Lei nº 13.964/2019, conhecida como Pacote Anticrime, foi incluído o parágrafo único no art. 25 do Código Penal, prevendo que agentes de segurança pública também podem agir em legítima defesa quando estiverem protegendo vítimas mantidas reféns durante a prática de crimes, desde que utilizem os meios necessários de forma moderada.
Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.
Isso reforça a já existente proteção legal da legítima defesa de terceiros, garantindo segurança jurídica para ações de agentes de segurança em situações críticas.
Excesso na legítima defesa
Nem sempre o uso da legítima defesa é perfeito. O agente pode cometer excesso, ou seja, ultrapassar os limites da ação necessária.
I - Excesso doloso
Ocorre quando o agente intencionalmente extrapola os meios de defesa.
Exemplo: Ana é atacada por um assaltante e consegue imobilizá-lo com um golpe. Insatisfeita, continua agredindo o agressor até causar ferimentos graves. Nesse caso, ela responderá pelo excesso doloso, pois houve intenção de ir além do necessário.
II - Excesso involuntário
Quando o agente não tinha intenção de exceder, mas ocorreu erro no uso do meio de defesa. Se o erro era evitável, haverá responsabilidade culposa; se era inevitável, não haverá punição.
III - Excesso exculpante
Ocorre quando o agente age com ânimo perturbado ou medo extremo, de forma que não seria razoável exigir moderação.
Exemplo: Laura é atacada por seu ex-companheiro armado com faca. Em estado de pânico, dispara repetidamente até neutralizar a ameaça. Neste caso, pode-se reconhecer o excesso exculpante, isentando-a de responsabilidade penal.
IV - Excesso extensivo
O excesso extensivo ocorre após cessada a agressão. Ou seja, o agente inicia sua reação de forma legítima, mas continua agindo mesmo depois que a ameaça já foi neutralizada.
Exemplo: Lucas é atacado por Bruno com faca. Para se defender, Lucas desarma Bruno e aplica dois golpes que cessam a agressão. No entanto, Lucas continua agredindo Bruno, que já está imobilizado, levando-o à morte.
Classificação do excesso extensivo:
- Doloso: O agente age propositalmente além do necessário. Responderá pelo crime doloso (ex.: homicídio).
- Doloso com erro: Se o erro era inevitável, há exclusão da pena; se evitável, a pena é reduzida.
- Culposo (involuntário): O agente não percebe o excesso. Se o erro era inevitável, não há punição; se evitável, responde culposamente.
V - Excesso intensivo
O excesso intensivo ocorre durante a agressão, quando o agente possui meios menos gravosos para repelir a agressão, mas opta por usar um meio mais severo do que o necessário.
Exemplo: José, um lutador profissional, foi atacado por Ricardo, um lutador iniciante. Para se defender, José utilizou uma arma de fogo, ainda que tivesse condições de conter o agressor apenas com suas técnicas de defesa pessoal.
A agressão ainda estava em curso, mas o uso de um meio desproporcional caracteriza excesso intensivo.
Classificação do excesso intensivo:
- Doloso: A escolha do meio gravoso é proposital.
- Doloso com erro: Se o erro era inevitável, há exclusão da pena; se evitável, pena reduzida.
- Culposo: O agente erra na intensidade da reação; o mesmo critério de evitabilidade se aplica.
Modalidades especiais de legítima defesa
Além da legítima defesa clássica, existem variantes que podem surgir em situações específicas.
I - Legítima defesa putativa
Ocorre quando o agente imagina estar sendo agredido, mas, na realidade, não há agressão injusta.
Exemplo: Diego acredita que seu colega Tiago vai atingi-lo com uma garrafa, mas Tiago apenas ajustava a camisa. Diego reage, causando lesões.
- Erro inevitável: A ação é considerada atípica, sem dolo nem culpa.
- Erro evitável: Exclui o dolo, mas permite punição culposa.
Base legal: Art. 20, §1º, Código Penal.
II - Legítima defesa sucessiva
Ocorre quando o agente inicial de uma agressão passa a ser vítima de um excesso cometido pela vítima original e reage novamente.
Exemplo: Renato agride Pedro com socos. Pedro se defende com moderação, mas Renato continua atacando. Pedro agora pode reagir contra o excesso de Renato, caracterizando legítima defesa sucessiva.
III - Legítima defesa subjetiva
Ocorre quando a agressão inicial cessou, mas o agente, de forma justificável, acredita que ainda está sob ataque.
Exemplo: Clara é alvo de disparos por Marco. Ele esgota toda a munição sem acertá-la, mas Clara, sem saber, continua atirando por acreditar que a agressão ainda persiste.
Observação: Assim como na legítima defesa putativa, aplica-se o art. 20, §1º, do CP, considerando a ação justificável diante das circunstâncias.
Quadro comparativo das modalidades de legítima defesa
| Modalidade | Situação |
|---|---|
| Própria | Defesa de direito próprio |
| Terceiro | Defesa de direito de outrem |
| Putativa | A agressão é imaginária |
| Subjetiva | A agressão cessou, mas o agente acredita que persiste |
| Sucessiva | Defesa contra excesso da legítima defesa anterior |
Considerações finais
A legítima defesa é um instrumento essencial para garantir a proteção de direitos fundamentais, como a vida e a integridade física.
Conhecer seus requisitos — agressão humana e injusta, atual ou iminente, defesa de direito próprio ou de terceiros, e uso moderado dos meios necessários — é fundamental para compreender quando a ação de um indivíduo é lícita.
O estudo da legítima defesa não é apenas teórico: situações reais exigem análise precisa do contexto e da proporcionalidade da reação, sempre respeitando os limites legais e as mudanças trazidas pelo Pacote Anticrime.
O conteúdo deste artigo baseia-se na legislação vigente e tem finalidade informativa.
Artigos recomendados

IA na Advocacia: Peça Processual Automatizada
Neste guia, abordaremos os diferentes tipos de peças processuais, suas estruturas, boas práticas de redação e estratégias para otimizar sua elaboração, destacando o uso de ferramentas jurídicas avançadas, como a Lawdeck.
Giulia Soares
26 de setembro de 2025
8 min de leitura

Como Criar uma Petição com IA Agora Mesmo
Descubra como elaborar uma petição em minutos com o auxílio da inteligência artificial no guia completo da Lawdeck.
Giulia Soares
07 de fevereiro de 2025
5 min de leitura

As 10 Melhores Plataformas Jurídicas em 2024
Com o avanço da inteligência artificial, novas plataformas surgiram para facilitar tarefas jurídicas. Identificamos as mais promissoras para 2024, após pesquisa detalhada.
Aline Monteiro
28 de março de 2024
23 min de leitura

