
Estelionato: O Que É e Como Funciona
Estelionato é o crime de obter vantagem ilícita, causando prejuízo a alguém, por meio de fraude ou engano. Previsto no art. 171 do Código Penal, exige que a vítima seja induzida em erro e entregue algo voluntariamente ao autor.

Giulia Soares
07 de julho de 2025
9 min de leitura

Giulia Soares
07 de julho de 2025
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Estelionato: O que é, como se configura e quais as consequências
O crime de estelionato está entre os delitos patrimoniais mais recorrentes no Brasil, especialmente com o avanço da tecnologia e a disseminação de golpes virtuais.
Regulamentado no art. 171 do Código Penal, esse tipo penal exige a ocorrência de dois resultados principais: o prejuízo da vítima e a vantagem ilícita obtida pelo autor mediante fraude.
Neste artigo, explicamos de forma clara e objetiva o que caracteriza o crime de estelionato, quais são suas formas típicas e equiparadas, as inovações legislativas e jurisprudenciais, além de apontar as diferenças com delitos semelhantes, como o furto mediante fraude.
O que é estelionato?
De acordo com o art. 171 do Código Penal, comete estelionato aquele que:
Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.
A pena prevista é de 1 a 5 anos de reclusão, além de multa.
O estelionato é, portanto, um crime doloso, material (exige resultado concreto) e que se consuma com a efetiva obtenção da vantagem ilícita em prejuízo da vítima.
A tentativa é admitida, desde que a fraude tenha sido iniciada, mas a vantagem não tenha sido obtida.
Formas equiparadas ao estelionato: condutas também criminalizadas pelo art. 171 do CP
Além da forma clássica do estelionato, o Código Penal, no § 2º do art. 171, estabelece diversas condutas equiparadas, que recebem a mesma pena da fraude tradicional.
Embora todas estejam abarcadas sob a rubrica do estelionato, cada uma possui características próprias e tipifica fraudes específicas. Veja a seguir:
- Disposição de coisa alheia como se fosse própria: quando alguém vende, troca, dá em garantia ou aluga bem que não lhe pertence, fazendo parecer que é o legítimo proprietário.
- Alienação fraudulenta de bem próprio: ocorre quando o agente negocia bem inalienável, litigioso ou onerado, ocultando essa condição da outra parte — especialmente comum em vendas parceladas de imóveis.
- Defraudação de penhor: caracteriza-se quando a pessoa que detém posse de objeto empenhado aliena ou compromete a garantia pignoratícia sem o consentimento do credor.
- Fraude na entrega de coisa: abrange a conduta de entregar produto com qualidade, quantidade ou substância inferior à acordada, gerando prejuízo ao destinatário.
- Fraude para receber seguro ou indenização: ocorre, por exemplo, quando o agente danifica propositadamente seu próprio patrimônio (ou até o próprio corpo), com o intuito de receber valor de seguro ou compensação indevida.
- Emissão fraudulenta de cheque: configura-se quando o sujeito emite cheque sem fundos ou frustra o pagamento deliberadamente, ainda que tenha conhecimento de sua impossibilidade de quitação no momento da emissão.
Cada uma dessas condutas amplia o alcance do crime de estelionato.
Como diferenciar estelionato de outros crimes?
É comum a confusão entre estelionato e furto qualificado pela fraude (art. 155, § 4º, II, do CP). A distinção, embora sutil, é essencial:
- Estelionato: a vítima entrega voluntariamente o bem ao ser enganada (ex: falsa promessa de venda).
- Furto com fraude: a fraude é usada para distrair a vítima, permitindo a subtração sem seu consentimento (ex: enquanto conversa com a vítima, o agente pega sua bolsa sem que ela perceba).
Requisitos do estelionato
Os requisitos para a configuração do crime de estelionato, conforme a doutrina majoritária e a interpretação do art. 171 do Código Penal, são exatamente esses:
- Fraude prévia ou concomitante à obtenção da vantagem: o agente deve empregar artifício, ardil ou outro meio fraudulento antes ou durante a obtenção da vantagem;
- Indução ou manutenção da vítima em erro: a fraude deve induzir ou manter a vítima em erro;
- Prejuízo patrimonial de terceiro: é necessário que alguém sofra efetiva perda patrimonial;
- Vantagem ilícita obtida pelo agente: o autor deve obter benefício indevido, próprio ou para terceiro.
Formas privilegiadas e equiparadas
O estelionato possui uma forma privilegiada, prevista no §1º do art. 171, quando o agente é primário e o prejuízo é de pequeno valor.
Nesses casos, o juiz pode aplicar a pena do furto privilegiado (art. 155, §2º, do CP), com possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.
Além disso, o §2º do mesmo artigo traz seis condutas equiparadas ao estelionato, com a mesma pena, como por exemplo:
- Vender como própria coisa alheia;
- Emitir cheque sem fundos;
- Ocultar coisa própria para obter indenização.
Estelionato por fraude eletrônica
Com a Lei nº 14.155/2021, foi incluído o § 2º-A ao art. 171, criando a forma qualificada de estelionato por fraude eletrônica:
§ 2º-A. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se a fraude é cometida com a utilização de informações fornecidas pela vítima ou por terceiro induzido a erro por meio de redes sociais, contatos telefônicos ou envio de correio eletrônico fraudulento, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo.
Ainda, o § 2º-B prevê aumento da pena de 1/3 a 2/3 se o agente utilizar servidor localizado fora do país.
§ 2º-B. A pena prevista no § 2º-A deste artigo, considerada a relevância do resultado gravoso, aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a utilização de servidor mantido fora do território nacional.
Exemplo prático
Maria, ao buscar por uma geladeira em promoção na internet, acessa um site que imita a identidade visual de uma grande varejista.
Após fornecer seus dados e realizar o pagamento, nunca recebe o produto. Trata-se de estelionato eletrônico, pois a vítima foi induzida em erro por um ambiente fraudulento.
Formas majoradas
O estelionato terá sua pena aumentada nas seguintes situações:
- § 3º – Crime cometido contra a Administração Pública ou entidades de assistência social, beneficência ou economia popular: aumento de 1/3 da pena.
- § 4º – Crime praticado contra idoso ou pessoa vulnerável: pena aumentada de 1/3 ao dobro.
Ação Penal: mudança com o Pacote Anticrime
Com a Lei nº 13.964/2019, a ação penal para o estelionato passou a ser, em regra, pública condicionada à representação da vítima.
Exceção: A ação será pública incondicionada se a vítima for:
- Administração Pública;
- Criança ou adolescente;
- Pessoa com deficiência mental;
- Idoso com mais de 70 anos ou incapaz.
Estelionato com criptoativos (Art. 171-A do CP)
Com o crescimento do uso de ativos digitais, a Lei nº 14.478/2022 inseriu o art. 171-A no Código Penal, tipificando:
Art. 171-A. Organizar, gerir, ofertar ou distribuir carteiras ou intermediar operações que envolvam ativos virtuais, valores mobiliários ou quaisquer ativos financeiros com o fim de obter vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento.
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
A pena é de 4 a 8 anos de reclusão e multa, e aplica-se a quem opera esquemas fraudulentos com criptomoedas, tokens e similares.
Jurisprudência e Súmulas relevantes sobre estelionato
A interpretação jurisprudencial do crime de estelionato é vasta e envolve questões ligadas à competência, natureza da ação penal, absorção de delitos e formas específicas de fraude.
A seguir, destacam-se entendimentos consolidados do STF e STJ sobre o tema:
- Fraude em medidor de consumo elétrico: a adulteração do sistema de medição de energia elétrica, com o intuito de mascarar o real consumo, configura estelionato e não furto, pois há indução da concessionária em erro e obtenção de vantagem ilícita (AREsp 1.418.119/DF).
- Súmula 246 – STF: não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos se inexistente a fraude. É necessário o elemento subjetivo do dolo para a tipificação penal.
- Súmula 554 – STF: o simples pagamento do cheque após o recebimento da denúncia não impede a continuidade da ação penal.
- Súmula 48 – STJ: a competência para julgar o crime de estelionato mediante falsificação de cheque é do juízo do local onde ocorreu a obtenção da vantagem ilícita.
- Súmula 73 – STJ: a utilização de cédulas grosseiramente falsificadas caracteriza, em tese, crime de estelionato, cuja competência é da Justiça Estadual.
- Súmula 107 – STJ: compete à Justiça Comum Estadual o julgamento do crime de estelionato quando praticado mediante falsificação de guias de recolhimento de contribuições.
- Súmula 17 – STJ: quando o crime de falsidade documental serve unicamente como meio para a prática do estelionato, é por este absorvido, não se configurando delito autônomo.
Considerações finais
O estelionato, embora tradicional, tem se adaptado às novas tecnologias e formas de interação social.
Golpes por meio de aplicativos de mensagens, clonagem de páginas e fraudes com ativos digitais representam desafios crescentes ao Direito Penal.
Advogados, estudantes e operadores do direito devem estar atentos às inovações legislativas e às mudanças jurisprudenciais para lidar com esse crime de forma técnica e eficaz.
O conteúdo desta página refere-se à legislação vigente no momento da publicação.
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