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Cessão de Direitos Hereditários: O Que É e Como Funciona

A cessão de direitos hereditários é a transferência, paga ou gratuita, da parte de um herdeiro na herança antes da partilha. Deve ser feita por escritura pública e comunicada no inventário.

Giulia Soares

29 de julho de 2025

7 min de leitura

Cessão de direitos hereditários: como funciona, quando fazer e cuidados essenciais

A cessão de direitos hereditários é uma alternativa jurídica cada vez mais utilizada por herdeiros que desejam transferir sua participação na herança, total ou parcialmente, para outra pessoa.

Essa cessão pode ocorrer de forma gratuita ou onerosa, e costuma ser estratégica em inventários complexos ou quando há necessidade de liquidez.

Você já ouviu falar de conflitos familiares que se arrastam por anos em razão da partilha de bens? Essa situação é mais comum do que parece — e, em muitos casos, poderia ser resolvida com a cessão de direitos hereditários realizada com segurança jurídica.

Neste artigo, explicamos o que significa essa cessão, em que situações ela pode ser vantajosa, quais cuidados tomar e quais são suas implicações legais e fiscais.

O que são direitos hereditários?

Os direitos hereditários correspondem ao conjunto de bens, direitos e obrigações deixados pelo falecido e que compõem a chamada herança. Esses direitos só se tornam propriedade individual dos herdeiros após a conclusão da partilha.

Até lá, a herança permanece indivisível, pertencendo de forma conjunta a todos os sucessores, que não podem alienar ou dispor de bens específicos de maneira isolada.

Em que situações vale a pena fazer a cessão de direitos hereditários?

A cessão é uma ferramenta útil em diferentes contextos:

  • Desinteresse na herança: Quando o herdeiro não deseja permanecer com sua parte nos bens do espólio.
  • Prevenção de conflitos: Para evitar disputas familiares e facilitar acordos durante o inventário.
  • Liquidez imediata: Quando há necessidade urgente de recursos, o herdeiro pode ceder sua quota em troca de pagamento.

Por ser uma operação que afeta diretamente o trâmite do inventário, a cessão deve observar requisitos legais específicos, que analisaremos a seguir.

Regras legais para a validade da cessão

A cessão de direitos hereditários deve seguir alguns requisitos essenciais para ter validade jurídica:

  • Escritura pública obrigatória: Conforme o art. 1.793 do Código Civil, a cessão só é válida se formalizada por escritura pública.
  • Fração ideal da herança: A cessão deve recair sobre a quota parte do herdeiro na herança como um todo, e não sobre bens específicos.
  • Consentimento do cônjuge: A depender do regime de bens, o cônjuge do cedente deve anuir com a operação (art. 1.647, I, do CC).
  • Preferência dos demais herdeiros: Quando a cessão é feita para terceiros, os outros herdeiros têm direito de preferência (art. 1.794 do CC).

A inobservância desses pontos pode levar à nulidade ou ineficácia da cessão, além de abrir margem para questionamentos judiciais futuros.

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Quem pode ceder seus direitos hereditários?

Qualquer herdeiro capaz pode realizar a cessão, desde que respeite os requisitos legais. Em caso de herdeiros menores ou incapazes, será necessário obter autorização judicial.

Entendimento do STJ: cessão de bem específico antes da partilha

A jurisprudência do STJ (REsp 1.809.548/SP) reconheceu que, embora a cessão de bens individualizados antes da partilha seja, em regra, ineficaz, ela pode ser validada se estiver condicionada à futura atribuição do bem ao herdeiro cedente.

Isso significa que a cessão é válida desde que se vincule à eventual partilha que formalmente destinará o bem ao herdeiro que cedeu seus direitos sobre ele.

Esse entendimento reforça a importância de uma cessão bem redigida, com cláusulas claras e respaldo legal.

Como se dá a cessão de direitos hereditários?

A cessão de direitos hereditários é um negócio jurídico que só pode ocorrer antes da conclusão do inventário, ou seja, enquanto a partilha ainda não foi homologada.

Após esse momento, os bens já estarão atribuídos individualmente aos herdeiros, inviabilizando a cessão da herança como um todo.

O herdeiro que deseja transferir sua parte na herança — seja de forma onerosa ou gratuita — deve contar com a orientação de um advogado especializado, responsável por elaborar o instrumento de cessão e acompanhar o processo de lavratura da escritura pública, conforme exigido por lei.

Após a assinatura do instrumento, a cessão deve ser levada ao conhecimento do juízo do inventário judicial ou, em caso de inventário extrajudicial, informada ao cartório responsável, para que produza os efeitos legais.

Cessão onerosa: venda da herança

Na cessão onerosa, o herdeiro transfere seus direitos hereditários mediante pagamento em dinheiro ou outra forma de contraprestação.

Trata-se, na prática, de uma negociação patrimonial: o cessionário (comprador) adquire a posição do cedente (vendedor) dentro do processo de inventário, assumindo seus direitos e obrigações.

Esse tipo de cessão é semelhante a uma compra e venda de quinhão hereditário, podendo ser realizada tanto com outro herdeiro quanto com terceiros alheios à sucessão, desde que respeitados os direitos de preferência dos demais herdeiros.

Cessão gratuita: doação da parte na herança

A cessão gratuita ocorre quando o herdeiro transfere seus direitos sem receber qualquer valor em troca, caracterizando uma doação.

Assim como na modalidade onerosa, o beneficiário da cessão pode ser um coerdeiro ou um terceiro, desde que atendidas as formalidades legais, especialmente quanto à escritura pública e à eventual anuência do cônjuge do cedente.

É importante lembrar que tanto a cessão onerosa quanto a gratuita podem gerar impactos fiscais (como ITCMD e IR), e devem ser feitas com cautela e acompanhamento profissional para evitar nulidades ou questionamentos futuros.

Efeitos jurídicos da cessão

A partir da formalização da cessão, o cessionário (quem recebe os direitos) passa a ocupar o lugar do herdeiro cedente no inventário, com todos os seus direitos e obrigações.

É importante considerar que:

  • O cessionário responderá por eventuais dívidas e encargos do espólio, salvo cláusula contratual em sentido contrário;
  • Se for descoberto um testamento posterior que altere a partilha, a cessão pode ser afetada, total ou parcialmente;
  • A cessão não transfere automaticamente bens determinados, apenas a fração ideal na herança.

Cuidados práticos ao realizar a cessão

Para evitar problemas na cessão de direitos hereditários, algumas medidas são recomendadas:

  1. Verifique a situação de todos os herdeiros — se houver incapazes, será necessária autorização judicial;
  2. Exija a anuência do cônjuge do cedente, independentemente do regime de bens;
  3. Formalize por escritura pública, evitando instrumentos particulares;

Aspectos tributários: atenção ao ITCMD e ao IRPF

A cessão de direitos hereditários pode gerar obrigações fiscais, dependendo da natureza da operação:

  • ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação): Incide sobre a cessão, conforme regras estaduais;
  • IRPF (Imposto de Renda de Pessoas Físicas): Pode incidir em cessões onerosas, caso haja lucro na operação.

Conclusão

A cessão de direitos hereditários é um instrumento relevante para facilitar a resolução de inventários, antecipar a partilha e até evitar litígios familiares. No entanto, sua validade depende de uma série de exigências legais, formais e fiscais.

Seja qual for o objetivo da cessão, é fundamental contar com assessoria jurídica qualificada para garantir a segurança do ato e prevenir futuras discussões judiciais.

O conteúdo desta página refere-se à legislação vigente no momento da publicação.

Giulia Soares

OAB/SP 471.425

Advogada. Bacharel em Direito pela Universidade Paulista. Especialista em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).