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Ação Civil Pública: Como Funciona

A Ação Civil Pública permite proteger direitos coletivos ou difusos, com o Ministério Público ou entidades legitimadas acionando judicialmente para reparar danos ou prevenir lesões.

Giulia Soares

07 de outubro de 2025

7 min de leitura

Ação civil pública: o que é, quem pode propor e como funciona

A ação civil pública é um dos instrumentos mais relevantes de tutela coletiva no ordenamento jurídico brasileiro.

Regulamentada pela Lei nº 7.347/1985 e prevista no art. 129, III, da Constituição Federal, ela permite que o Ministério Público e outros legitimados atuem na defesa de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos.

Mais do que um simples meio processual, a ação civil pública representa um mecanismo essencial de proteção social e de controle da legalidade administrativa, assegurando que bens e valores de interesse público sejam preservados.

O que é a ação civil pública?

A ação civil pública (ACP) é um instrumento processual voltado à responsabilização civil por danos morais e patrimoniais causados a determinados bens ou interesses coletivos.

De acordo com o art. 1º da Lei nº 7.347/1985, ela pode ser utilizada para reparar danos:

  • ao meio ambiente;
  • ao consumidor;
  • a bens e direitos de valor artístico, histórico, turístico, paisagístico e estético;
  • a interesses difusos ou coletivos;
  • à ordem econômica e urbanística;
  • à honra e dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos;
  • e ao patrimônio público e social.

O rol previsto na lei é exemplificativo, o que significa que a ação civil pública pode ser utilizada em outras situações em que haja lesão a direitos metaindividuais.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reforça a legitimidade do Ministério Público para propor a ACP, conforme a Súmula 329:

O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa do patrimônio público.

Limites de cabimento

A ação civil pública não pode ser utilizada para tratar de temas tributários, contribuições previdenciárias, FGTS ou outros fundos de natureza institucional, cujos beneficiários sejam individualmente identificáveis.

Essa restrição está expressa no parágrafo único do art. 1º da Lei nº 7.347/1985, e costuma ser ponto frequente em discussões jurídicas.

Competência para julgar a ação civil pública

A competência é absoluta e se define pelo local onde ocorreu o dano, conforme o art. 2º da Lei nº 7.347/1985 e entendimento consolidado do STJ (AgRg nos EDcl no CC 113788/DF).

Além disso, a propositura da ação civil pública previne a jurisdição do juízo, ou seja, o juiz que primeiro apreciar a demanda será prevento para julgar todas as ações que tenham a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto (art. 2º, parágrafo único).

O Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do RE 1101937, também firmou entendimento de que, em caso de múltiplas ações civis públicas com abrangência nacional ou regional, prevalece o juízo que primeiro conheceu da matéria.

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Quem pode propor a ação civil pública?

O art. 5º da Lei nº 7.347/1985 estabelece um rol de legitimados ativos para ajuizar a ação civil pública. São eles:

  • Ministério Público;
  • Defensoria Pública;
  • União, Estados, Distrito Federal e Municípios;
  • Autarquias, empresas públicas, fundações e sociedades de economia mista;
  • Associações que preencham dois requisitos cumulativos:
  1. estejam constituídas há pelo menos um ano, conforme a lei civil;
  2. incluam entre suas finalidades institucionais a defesa dos interesses protegidos pela ACP (meio ambiente, consumidor, patrimônio público etc.).

Caso o Ministério Público não atue como parte, ele deverá atuar como fiscal da lei (custos legis).

O Poder Público e outras associações legitimadas podem ingressar no processo como litisconsortes de qualquer das partes, conforme § 2º do mesmo artigo.

Se a associação desistir sem justificativa plausível, o Ministério Público ou outro legitimado poderá assumir a titularidade ativa da ação (§ 3º).

Jurisprudência relevante sobre legitimidade

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou entendimento no sentido de que, em caso de dissolução da associação autora da ação civil pública, é possível a substituição processual pelo Ministério Público (AgInt no REsp 1.582.243-SP, julgado em 14/02/2023).

Além disso, quando a ação tramita na Justiça Estadual, e a associação é dissolvida, a legitimidade é do Ministério Público estadual, mesmo que o processo tenha subido ao STJ (REsp 1.678.925-MG).

Procedimento da ação civil pública

O procedimento da ação civil pública apresenta peculiaridades que a diferenciam das ações individuais. Confira os principais pontos:

  • O interessado pode solicitar certidões e informações às autoridades competentes, que deverão ser fornecidas em até 15 dias;
  • O Ministério Público pode instaurar inquérito civil e requisitar informações, perícias e documentos públicos ou particulares, com prazo mínimo de 10 dias úteis para resposta;
  • É admitida a emenda da petição inicial, inclusive após a contestação, em caso de pedido genérico (REsp 1.279.586-PR);
  • Caso o MP entenda que não há fundamento para a ação, deverá arquivar o inquérito civil de forma fundamentada, enviando os autos ao Conselho Superior do Ministério Público em até 3 dias;
  • O juiz pode conceder efeito suspensivo a recursos, quando houver risco de dano irreparável;
  • Se, passados 60 dias do trânsito em julgado da sentença condenatória, a associação autora não promover a execução, o Ministério Público deverá fazê-lo, sendo facultada igual iniciativa aos demais legitimados.

Inconstitucionalidade do art. 16 da Lei da Ação Civil Pública

O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 16 da Lei nº 7.347/1985, que limitava os efeitos da sentença à competência territorial do órgão prolator.

Com isso, as decisões proferidas em ação civil pública podem ter alcance nacional, desde que os efeitos da lide o justifiquem — observando-se o art. 93, II, do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990).

Litigância de má-fé e penalidades

A associação autora e seus diretores responsáveis podem ser solidariamente condenados por litigância de má-fé, caso atuem com dolo ou abuso processual.

As sanções incluem o pagamento de honorários advocatícios, o décuplo das custas processuais e eventual indenização por perdas e danos.

Principais súmulas sobre ação civil pública

  • Súmula 329/STJ: “O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa do patrimônio público”.
  • Súmula 643/STF: “O Ministério Público tem legitimidade para promover ação civil pública cujo fundamento seja a ilegalidade de reajuste de mensalidades escolares”.
  • Súmula 489/STJ: “Reconhecida a continência, devem ser reunidas na Justiça Federal as ações civis públicas propostas nesta e na Justiça Estadual”.
  • Súmula 601/STJ: “O Ministério Público tem legitimidade ativa para atuar na defesa de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos dos consumidores, ainda que decorrentes da prestação de serviço público”.

Considerações finais

A ação civil pública é um dos pilares do sistema brasileiro de tutela coletiva de direitos, funcionando como verdadeiro instrumento de cidadania e controle social.

Ao garantir que interesses difusos e coletivos sejam defendidos de forma eficaz, a ACP fortalece o papel do Ministério Público e demais legitimados na proteção do meio ambiente, patrimônio público, direitos do consumidor e valores sociais.

Dominar sua estrutura, legitimidade e jurisprudência é essencial para qualquer advogado que atue nas áreas cível, administrativa ou ambiental.

O conteúdo desta página refere-se à legislação vigente no momento da publicação.

Giulia Soares

OAB/SP 471.425

Advogada. Bacharel em Direito pela Universidade Paulista. Especialista em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).