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Direito de Arrependimento: O Que é, Como Funciona e Quando Pode Ser Aplicado

O direito de arrependimento se trata de um direito do consumidor de desistir de uma compra feita fora da loja física, no prazo de 7 dias corridos, contados da assinatura do contrato ou do recebimento do produto ou serviço.

Giulia Soares

22 de maio de 2025

7 min de leitura

Direito de arrependimento: o que advogados devem saber sobre prazos, limites e aplicações

No cenário atual de consumo digital, entender os contornos legais do direito de arrependimento é essencial para quem atua na advocacia.

Com a ampliação das compras feitas fora de estabelecimentos físicos — especialmente pela internet — aumentaram também os conflitos envolvendo devoluções, reembolsos e negativas indevidas por parte de fornecedores.

Neste artigo, vamos explorar os principais aspectos jurídicos do direito de arrependimento, com foco em sua aplicação prática, exceções legais e estratégias para orientar corretamente seus clientes.

O que é o direito de arrependimento?

Trata-se de uma prerrogativa conferida ao consumidor para desistir de uma compra ou contratação realizada fora do estabelecimento comercial, no prazo de sete dias corridos, a contar da assinatura do contrato ou do recebimento do produto ou serviço.

Nos termos do art. 49 do CDC, o consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar da assinatura ou do recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação ocorrer fora do estabelecimento comercial.

A norma tem como finalidade proteger o consumidor da falta de contato direto com o bem adquirido, resguardando-o de decisões impulsivas ou feitas com base em informações limitadas.

Essa hipótese abrange, principalmente:

  • Compras pela internet ou aplicativos;
  • Contratações por telefone, catálogo ou televisão;
  • Vendas em domicílio (ex: representantes comerciais, venda porta a porta).

A base legal para o exercício desse direito está prevista no artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.

Como o prazo é contado?

O prazo legal é de 7 (sete) dias corridos, não se interrompendo em finais de semana ou feriados.

Para produtos, o prazo inicia no dia seguinte ao recebimento do item; para serviços, a contagem começa a partir da assinatura do contrato.

É importante que advogados estejam atentos à documentação comprobatória dessas datas, como o aviso de recebimento (AR), confirmação de entrega ou comprovante de pagamento.

Efeitos do exercício do direito

O exercício do direito de arrependimento independe de justificativa por parte do consumidor. Basta que ele manifeste sua vontade de desistir da contratação dentro do prazo legal.

  • O contrato deve ser rescindido sem penalidade;
  • O consumidor tem direito ao reembolso integral;
  • Os valores pagos devem ser devolvidos de forma imediata e monetariamente atualizada;
  • O consumidor não precisa apresentar justificativa.

Para advogados que representam consumidores

É essencial verificar:

  • A data exata do recebimento do produto ou serviço;
  • Se houve informação clara e adequada sobre o direito de arrependimento;
  • Se o fornecedor impôs restrições abusivas ao exercício do direito;
  • Se o produto foi personalizado ou perecível, o que pode excluir o direito.

Além disso, o advogado deve instruir o cliente sobre a forma correta de notificação ao fornecedor, preferencialmente por escrito e com comprovação de envio.

Para advogados que representam empresas

O advogado deve:

  • Auxiliar na elaboração de políticas de devolução transparentes, alinhadas ao CDC;
  • Recomendar a inserção de cláusulas claras sobre o exercício do direito;
  • Instruir sobre a obrigatoriedade de informação prévia ao consumidor;
  • Orientar sobre a exclusão de certas categorias de produtos (como personalizados ou digitais);
  • Avaliar a necessidade de ajustes nos fluxos logísticos e financeiros para absorver os pedidos de devolução.
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Exceções ao direito de arrependimento

Embora o direito de arrependimento seja uma garantia prevista pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), sua aplicação não é absoluta.

Existem situações específicas — previstas em lei, normas regulatórias ou consolidadas pela jurisprudência — nas quais esse direito não pode ser exercido. Conhecer essas exceções é fundamental para orientar corretamente o cliente e evitar demandas indevidas.

I - Compras realizadas presencialmente: A desistência da compra em até 7 dias só se aplica a contratos firmados fora do estabelecimento comercial. Em aquisições feitas diretamente em lojas físicas, não há previsão legal para devolução por arrependimento.

Nesse cenário, eventuais trocas ou reembolsos dependem da política comercial do lojista, exceto nos casos de vício ou defeito do produto (art. 18 do CDC).

II - Produtos personalizados ou de natureza perecível: Artigos confeccionados sob medida ou que se deterioram rapidamente — como alimentos, flores ou medicamentos — estão excluídos da proteção do art. 49 do CDC.

A revenda desses bens após a devolução pode ser inviável, o que justifica a restrição legal ao exercício do arrependimento.

III - Conteúdos digitais, cursos e jogos online: Embora fornecedores frequentemente tentem limitar esse direito, a orientação majoritária é no sentido de que o direito de arrependimento se aplica a contratos digitais firmados fora do ambiente físico — desde que o serviço não tenha sido integralmente utilizado.

Nesses casos, o desafio jurídico está na comprovação do momento em que o consumidor passou a usufruir do conteúdo.

IV - Transporte aéreo: A compra de passagens aéreas é regulada por norma própria da ANAC (Resolução nº 400/2016).

O consumidor pode cancelar a passagem sem custos em até 24 horas após a compra, desde que ela tenha sido feita com, no mínimo, 7 dias de antecedência da data do voo. Trata-se de exceção específica que complementa o CDC.

Veja o que dispõe o artigo 11 da Resolução nº 400/2016 da ANAC:

Art. 11. O usuário poderá desistir da passagem aérea adquirida, sem qualquer ônus, desde que o faça no prazo de até 24 (vinte e quatro) horas, a contar do recebimento do seu comprovante.
Parágrafo único. A regra descrita no caput deste artigo somente se aplica às compras feitas com antecedência igual ou superior a 7 (sete) dias em relação à data de embarque.

V - Contratos imobiliários e de locação: Transações imobiliárias e locações são regidas por legislação específica.

O direito de arrependimento, neste contexto, não é aplicável. A desistência do contrato está condicionada às cláusulas pactuadas entre as partes, incluindo a incidência de multa por rescisão antecipada, conforme estipulado contratualmente.

Outras hipóteses de exclusão

Diversas regulamentações setoriais e interpretações jurisprudenciais reconhecem limites adicionais ao direito de arrependimento, especialmente quando:

  • O produto é de consumo imediato ou se deteriora em pouco tempo;
  • O serviço já foi integralmente prestado, com ciência do consumidor;
  • O conteúdo digital foi acessado ou iniciado via download;
  • O bem foi personalizado exclusivamente para o cliente.

Considerações finais

O direito de arrependimento, previsto no CDC, é uma proteção essencial ao consumidor e deve ser respeitado por quem comercializa fora do estabelecimento físico.

Para o advogado, trata-se de um campo fértil para atuação preventiva e contenciosa, exigindo atualização constante sobre práticas de mercado, plataformas digitais e interpretação jurisprudencial.

Seja orientando consumidores ou assessorando fornecedores, o advogado deve tratar o direito de arrependimento com a devida cautela, garantindo que os contratos, políticas de devolução e canais de atendimento estejam em plena conformidade com a legislação.

O conteúdo desta página refere-se à normatização vigente no momento da publicação.

Giulia Soares

OAB/SP 471.425

Advogada. Bacharel em Direito pela Universidade Paulista. Especialista em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).